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Invisibilidade e exclusão sanitária: frutos da diversidade incompreendida

Tatiana Adriano e Laura Pimenta

Carregando o tema Universos (In)visíveis a 11ª edição do Festival de Verão da UFMG contou com a participação da co-coordenadora do Programa Nacional de Saneamento Rural  (PNSR), Sonaly Rezende. O miniauditório do Conservatório da UFMG foi sede do debate que abordou a exclusão sanitária como causa e consequência da invisibilidade de populações rurais. Sonaly também é professora do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG, além de referência em pesquisas de políticas públicas em saneamento, com ênfase nas diferentes formas de gestão de serviços e soluções para o assunto.

A professora iniciou sua fala destacando que a temática abordada perpassa um círculo vicioso, pois ao mesmo tempo em que a exclusão sanitária determina a invisibilidade ela é determinada por ela. Sendo assim, é preciso ter em mente que sempre haverá diálogo entre esses dois conceitos. Mas, afinal de contas, o que é exclusão sanitária? Para tal análise, precisamos buscar amparo nos padrões estabelecidos por organismos reconhecidos, como a Organização das Nações Unidas (ONU). Essa, em 2010, estabeleceu o esgotamento sanitário e a água como direitos humanos. Ou seja, todo indivíduo tem direito à água segura – não oferece agravos para a saúde humana – em quantidade suficiente para atender suas necessidades domésticas e essenciais. Além disso, deve ser aceitável – para que as pessoas não tenham necessidade de procurar e consumir água em outras fontes, que podem oferecer riscos à saúde; fisicamente acessível, 24 horas por dia – que não seja preciso buscá-la em outras localidades; preço razoável – apesar de um direito, a água também é um produto, porém seu custo não pode proporcionar dificuldade em seu acesso. Em relação ao esgotamento sanitário, estabelece-se que existam instalações sanitárias bem construídas com fácil acesso a pontos de água, almejando garantir saúde, dignidade e privacidade aos indivíduos.

Em 2015, de acordo com dados divulgados pelo Programa de Monitoramento Conjunto da ONU, 663 milhões de pessoas não possuíam acesso à água potável melhorada e 2,4 bilhões não tinham acesso ao esgotamento sanitário melhorado. Diante dos dados uma meta: que, em 2030, o acesso universal e equitativo a higiene e água potável sejam garantidos a todos. Sabe-se que o déficit de atendimento e a invisibilidade são as principais razões para não avançarmos na universalização de acesso ao saneamento. As ações sanitariamente adequadas não são estáticas, elas variam de acordo com o contexto e singularidades de cada realidade. Na extensa área rural brasileira composta por diferentes modos de vida, culturas e saberes é um desafio conhecer e compreender as necessidades das populações. Desafio maior consiste em romper com a invisibilidade de décadas, seja pela desconsideração de práticas consolidadas ou por se ignorar demandas específicas.

Embora normalmente associado ao esgotamento sanitário, o saneamento básico, no Brasil, consiste em um conjunto de ações que envolvem: abastecimento de água, limpeza urbana, manejo dos resíduos sólidos, esgotamento sanitário, manejo de águas fluviais e serviços de drenagem em todas as áreas urbanas. Esse conjunto de ações determinam os princípios fundamentais: integralidade – uma ação não é mais importante que as outras; universalização – tais ações devem ser oferecidas a todos os cidadãos; intersetorialidade – é preciso que diferentes setores, de diferentes esferas, discutam saneamento para que as medidas adotadas sejam mais assertivas; controle social – das ações e visões individuais que caminha-se para as coletivas, que terão volume e alcance mais amplos que o domiciliar.

Devido à ausência completa ou parcial de soluções e serviços adequados de saneamento, as populações rurais são obrigadas a abusarem da criatividade para desenvolverem métodos alternativos que atendam suas necessidades.  Contudo, sabe-se que 69% das áreas rurais ainda destinam seus resíduos de forma inadequada – jogando-os em rios e lagos, deixando-os a céu aberto, queimando-os, comprometendo a salubridade. Sonaly ressaltou que é preciso oferecer atenção especial para as mulheres, meninas e outros indivíduos em situação de vulnerabilidade. Por exemplo, mais acesso à água concede maior liberdade às mulheres que poderão dedicar seu tempo em outras atividades, aumentando sua qualificação, produtividade e participação social.

Também foi destacado a forma de atuação e os resultados do Sistema Integrado de Saneamento Rural (Sisar). Construído de forma colaborativa, trata-se de uma parceria entre o poder público, técnicos e as comunidades, uma associação dos conhecimentos técnicos e saberes tradicionais. “É preciso ouvir, falar a língua daqueles com quem trabalhamos, é preciso compreender o outro”, afirmou Sonaly enfatizando a importância da participação das comunidades: “elas precisam se organizar em associações e eleger seus representantes para que cuidem e façam o sistema funcionar adequadamente.”

Sonaly finalizou seu discurso reiterando que a exclusão de classe, racial e de gênero permanecem uma constante em nossa sociedade. Diante disso, afirmou que garantir saneamento básico para os públicos excluídos é promover a saúde, melhorar a qualidade de vida, contribuir para a erradicação da pobreza e, acima de tudo, garantia de direitos.

Sonaly Rezende, co-coordenadora do PNSR, discute a invisibilidade e exclusão sanitária

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